De 2010 a 2021, a Bahia registrou 39.037 acidentes de trabalho no estado, segundo dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) do SUS. O número saltou de 1.133 casos em 2010, para 6.469 no ano passado, um crescimento de 470% no período. Para conscientizar a população sobre os riscos desses acidentes, será lançada na próxima segunda-feira (11), às 14 horas, no Salvador Shopping, a campanha “Acidentes de trabalho: é urgente evitar!”. A ação é promovida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), em parceria com o Instituto de Saúde Coletiva da UFBA e a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab).

A campanha contará com uma exposição de materiais informativos nas dependências internas do Salvador Shopping, além de um conteúdo digital elaborado especialmente para as redes sociais e sites das instituições envolvidas, incluindo ampla divulgação através de sindicatos, fóruns e associações. O material traz orientações gerais relacionadas aos acidentes de trabalho, como a importância da proteção coletiva para prevenção, o uso dos Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) para redução de danos, as obrigações legais das empresas e os direitos dos trabalhadores em relação à saúde e à segurança no trabalho. A campanha segue até o dia 1º de maio.

O público-alvo é formado por trabalhadores das áreas com as maiores taxas de acidentes e de mortes no trabalho: construção civil, indústria, agricultura, mineração e transporte, com destaque para os motociclistas. Em 2020, um estudo divulgado pelo Instituto de Saúde Coletiva da UFBA mostrou que as motocicletas já representavam 20% do total de mortes por acidentes de trabalho no trânsito. Com o aumento do número de serviços realizados por aplicativos de entrega, principalmente na pandemia, os riscos entre esses trabalhadores podem ser ainda mais expressivos.

“Esses acidentes, com sequelas temporárias ou permanentes, geram altos custos sociais para os trabalhadores e suas famílias, assim como para o SUS, a Previdência Social e as empresas, impactando diretamente no desenvolvimento econômico social do país e do estado da Bahia”, destaca o professor Cleber Cremonese, professor do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA.

Motivação da campanha

A campanha é motivada por uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra o Salvador Shopping e a empresa responsável por uma obra no local, realizada em 2007, e que resultou na morte de um operário, vítima de acidente de trabalho.

Dentre outras ações, a sentença condenou as empresas a custear uma campanha de prevenção de acidentes de trabalho nas dependências do Salvador Shopping. A partir disso, o MPT realizou um acordo de cooperação técnica com a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) para a execução da presente campanha.

O perfil das vítimas

”Deixei a minha camisa desabotoada e, quando me agachei para pegar as espigas de milho, a manga da camisa enrolou na máquina e meu braço foi puxado para dentro do equipamento”. O relato é do agricultor Edilson Batista Neves, que perdeu um dos braços após sofrer um acidente de trabalho enquanto manuseava uma máquina de bater milho em Crisópolis, no interior da Bahia.

O depoimento faz parte da série de vídeos da campanha “Acidentes de trabalho: é urgente evitar!”, que tem como objetivo conscientizar os trabalhadores sobre a importância da prevenção nos locais de trabalho. “Ficou um trauma muito grande, mas a gente vai aprendendo com a vida”, reflete o agricultor.

De acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), os agricultores como Edilson representam o segundo ramo de atividade mais vulnerável para acidentes de trabalho no estado (8,3%), ficando apenas atrás dos pedreiros (9,6%) e à frente dos soldadores (8,1%), que ocupam a terceira posição. Em relação à classificação dos trabalhadores por grupos mais amplos, 40% dos acidentes foram registrados na área de produção de bens e serviços, seguidos pela agropecuária (16%).

Os acidentes que ocasionaram maior frequência de incapacidade parcial e total foram registrados para soldadores (7,2%), operadores de máquinas fixas (4%) e pedreiros (1,7%). Para o grupamento de acidentes fatais, motoristas de caminhão (9,6%), pedreiros (9,4%) e trabalhadores agropecuários (9,3%) lideram o ranking.

Ainda segundo o Sinan, Salvador lidera o ranking de acidentes de trabalho no estado: foram 12.382 casos entre os anos de 2010 e 2021, o que equivale a 32% do total de acidentes registrados na Bahia. O levantamento também descreve o perfil da maioria das vítimas desses acidentes em todo o estado. São pessoas entre 30 e 39 anos (29%), que trabalham na informalidade (37,5%) e do sexo masculino (86%).

O problema da subnotificação

O Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do SUS aponta que 34.683 pessoas morreram por acidentes de trabalho no Brasil entre 2010 e 2019. Na Bahia, foram 1.750 casos fatais (5%) no mesmo período. Em Salvador, foram registradas 195 mortes, sendo 92% de trabalhadores homens.

Segundo a Previdência Social, que registra apenas os acidentes ocorridos com trabalhadores segurados com vínculos pela CLT, 81% dos casos foram dos chamados acidentes típicos (o que ocorre na execução do trabalho) e 19% de acidentes de trajeto (o que ocorre no percurso da residência para o trabalho ou vice-versa). De 2018 a 2020, o órgão registrou um total de 31.552 acidentes de trabalho entres os segurados, sendo 69% das vítimas homens e 31% mulheres.

Apesar dos registros oficiais consultados, o professor Cleber Cremonese chama a atenção para o possível problema da subnotificação nesses bancos de dados, seja em relação aos trabalhadores celetistas, como também entre aqueles sem vínculos formais e nos diversos ramos de atividade econômica. “Muitos desses casos permanecem na invisibilidade, o que reflete na dificuldade de atuar na prevenção e aplicação de medidas mais efetivas destinadas à proteção e segurança desses trabalhadores”, conclui.